domingo, 29 de março de 2009

Nova remodelação do dispositivo

Abertos os itinerários principais da zona dos Dembos, sobretudo os convergentes em Nambuangongo, conseguido o objectivo estratégico e publicitário da ocupação daquela vila, o poder político, em Lisboa, apressou-se a anunciar o fim das operações de combate, fazendo crer que agora as forças militares apenas faziam acções policiais, na ausência de uma polícia civil efectiva.
Neste contexto procedeu-se a uma grande remodelação do dispositivo, fazendo coincidir a ocupação militar no terreno com a divisão administrativa.
Foi assim criado o Sub-sector do DANDE que correspondia ao concelho com o mesmo nome.
O Dispositivo do Sub-sector do DANDE passou a ser o seguinte:

  1. Cmd e CCS (+ 1 Pel) - Mabubas
  2. CCaç (-) - Quicabo
    1 Pelotão -Anapasso (Ponte do Lifune)
    1 Pelotão -Balacende
  3. CCaç -Tentativa
  4. CCaç -Quissacala
  5. CCaç (-) -Úcua
    1 Pelotão -Quissacala da Pedra Verde (Quissacala II)
    1 Pelotão -Fazenda Quibaba (Quibaba II)
  6. CCaç (-) -Roça Bom Jesus
    1 Pelotão -Mazumbo

    O Comandante do BC 114 assumiu o Comando do Sub-sector do DANDE em 04DEZ62.
    A missão de quadrícula consistia especialmente no apoio a equipas de Obras Públicas que começaram a limpar as faixas laterais das picadas, segurança dos transportes de pessoas e bens e patrulhamentos pelas respectivas zonas de responsabilidade, sendo frequentes os contactos com o IN, que se manifestava de forma esporádica, mas fazendo sempre sentir a sua presença. Por esse motivo as grandes operações continuaram como adiante referirei, com evidência especial para as operações "GRANADA" e "PÉ LEVE".

domingo, 22 de março de 2009

Este admirável mundo da blogosfera!

Um blog não é um livro de memórias nem um caderno de apontamentos, mas aquilo que o seu autor quiser.
É um sítio imaginário onde se podem encontrar as mais variadas e inesperadas situações.
Na blogosfera tudo é possível desde relatos históricos a encontros de amigos antigos ou recentes.
Sendo este um blog para ligar os elementos da CC 115, hoje tivémos uma grande e agradável surpresa: após um comentário ao post "CC 115 em Quicabo a Guerra continua", a que respondi, recebi hoje este e-mail que, com a devida vénia e autorização, aqui publico para conhecimento dos que nos visitam, em especial dos elementos da CC 115.

"Exm.º Senhor António Nobre de Campos (NOCA?)

A honra é toda minha em conhecer Homens que defenderam uma Pátria, com sacrifícios extremos, longe daqueles que lhes eram mais queridos. E, acredite, tenho poucas dúvidas que essa Pátria pouco ou nada tem feito (nem fará!) para merecer o valor de tais Homens…
A relação agora descoberta e que me liga indirectamente à CC 115 é com o Capitão Falcão, então Comandante da Companhia. Era meu Tio.
Infelizmente, enquanto ele era vivo, nunca nos aproximámos o suficiente para partilhar as experiências de uma forma mais profunda. Agora, ao olhar para as fotografias que estão no vosso blog, sou confrontado com fortes sensações e emoções de orgulho, saudade e tristeza…enfim!
No âmbito das minhas actuais funções de professor no Instituto de Estudos Superiores Militares (IESM), ao preparar uma investigação sobre as Grandes Comandantes e Batalhas do Exército Português, e que irão ser publicadas periodicamente no Jornal do Exército, deparei-me com o vosso blog. Foi uma excelente surpresa.
Como compreenderá, gostaria bastante de saber mais sobre os episódios que aconteceram na CC 115. Se de alguma forma estiverem a pensar em reunir numa publicação as vossas experiências, teria muito gosto em adquirir um exemplar. De qualquer forma, irei ler com toda a atenção o vosso blog.
Caso passe pelo IESM terei todo o gosto em convidá-lo para almoçar e conhecê-lo melhor.
Reitero a elevada consideração,
Luis Carlos Falcão Escorrega
Major de Infantaria"


Nota:- O Senhor Major Falcão é Professor de Estratégia no IESM

Outra surpresa agradável e que, de certo modo, vem de encontro aos desejos manifestados pelo Senhor Major Falcão é o trabalho que o Amigo e Camarada VALHOR me enviou e aqui publico com o maior gosto: é um relato na primeira pessoa de quem viveu esses acontecimentos trágicos de 15 de Julho de 1961! Este não é um "bobo", mas um herói, porque fez e viveu a História!

""VALHOR disse:
Volto à emboscada de Quanda Maúa - Quicabo
Este histórico acontecimento merece e justifica uma melhor atenção e apreciação por parte dos historiadores. A história deverá fornecer, com verdade, a compreensão do presente (enquanto houver presente!) através da análise do passado, a fim de evitar que "factores invisíveis" ritmem e determinem o processo histórico futuro.
No meu blog ...valhor..."Episódios Avulsos" e outros, falei muito sucintamente acerca desse feroz combate.
O NOCA neste seu blog fala constantemente desse acontecimento. Porque será?
Certamente que não o faz por fazer! Juntando todas as peças do "puzzle" talvez deixe adivinhar o motivo. Não tenho quaisquer dúvidas de que este acontecimento mereceria outra atenção! Peço ao leitor, que pare de ler durante uns breves segundos, pense, e se interrogue: - "Se se visse envolvido num destes cenários de luta corpo a corpo, fazendo parte integrante de uma das facções contendoras, ambas armadas, qual seria a sua reacção?". Dá que pensar, não dá? Aconteceu aos homens da CC 115 que, de um momento para o outro se viram confrontados com uma situação que se afigurava surreal antes do confronto.
O "IN" preparou e envolveu nesta emboscada cerca de cinco centenas de guerrilheiros, enérgicos e exercitados para a guerra de guerrilha. O seu chefe, colocou os seus combatentes junto "à picada" a coberto da vegetação, e, à passagem da coluna de viaturas pelo local, ao sinal de "apito" lançou, de repente, vagas sucessivas de homens, num ataque inimaginável sobre os nossos militares que seguiam nas primeiras viaturas. Antes dos nossos militares terem esboçado qualquer tipo de defesa ou eventualmente de contra-ataque, já os guerrilheiros se encontravam agarrados às nossas viaturas. Esta operação realizada de surpresa pelos guerrilheiros, (ocultos na mata), sobre uma força em movimento muito lento devido às características da picada, poderia ter tido um resultado catastrófico para as nossas forças, não fora a coragem, a abnegação, a bravura e a valentia que é tida como uma qualidade mental que reconhece o medo, mas que permite que as pessoas enfrentem o perigo com firmeza, apanágio dos soldados portugueses que reagiram energicamente ao ímpeto dos guerrilheiros. Foi, sem dúvida, um pandemónio o que ali aconteceu, um acto heróico, aquela peleja de "luta corpo a corpo" que poderia ter tido consequências muito sérias para as cores nacionais. Refira-se que alguns guerrilheiros chegaram a saltar para cima das nossas viaturas, (ali bloqueadas), a fim de tentarem apoderar-se de uma metralhadora ligeira que se encontrava instalada num dos jipões. Situações houve em que os guerrilheiros se agarraram aos canos das nossas armas na tentativa de se apoderarem delas, o que não conseguiram. A meu ver, esta inédita acção bélica, de tão grande envergadura e de características invulgares justificaria ser relatada publicamente para que pudesse figurar nos anais da nossa História, não como uma lenda que o não é, mas como um facto ocorrido no dia 15 de Julho de 1961, em Angola "".

sábado, 14 de março de 2009

A História e a Mitologia

A propósito dos livros que estão a ser publicados e distribuídos com o jornal Correio da Manhã e sobretudo a propósito da Operação Viriato, convém fazer algumas observações e desfazer alguns mitos, esclarecendo até alguns erros e omissões mais chocantes, para que não se exaltem demasiado os “heróis”, nem se amesquinhe a arraia miúda que fez efectivamente a Guerra e a sofreu – muitos, (demasiados, um já seria muito), lá ficaram!
O Mito de Nambuangongo
Um dos estádios da guerra subversiva é a ocupação de parte do território que se pretende “conquistar” e instalar aí o poder da guerrilha, instituindo um governo provisório, que poderá estar algures no estrangeiro. Por esse motivo e para que outros movimentos não se antecipassem, (o MPLA havia desencadeado os acontecimentos de Luanda, em Fevereiro), a UPA avançou de modo precipitado e com o maior terror possível, com os ataques a Fazendas e localidades no norte de Angola e Dembos, em Março (16) e deu um salto qualitativo com a criação do “Reino independente de Nambuangongo”.
Mas Nambuangongo como fortaleza ou lugar de resistência já não existia: quantas vezes terá sido bombardeada pela aviação portuguesa? Só a igreja estava em pé e tinha-se salvo uma imagem de N.S. de Fátima. Curioso, não é? Pois, quem respeitou a igreja e a imagem da virgem foram os pilotos que atacaram a vila.
Os “turras” não tinham capacidade para fazer tão grandes destruições, embora tenham destruído tudo o que puderam, mas, nas construções, procuravam sobretudo as canalizações para fazer os canhangulos.
Operação Viriato
Tendo por objectivo propagandístico ocupar Nambuagongo, ela não pode resumir-se a esse “pequeno? grande?” episódio. A resistência do IN manifestou-se e instalou-se na floresta, santuário e refúgio das populações e dos guerrilheiros que, em momentos por si escolhidos, acorriam aos caminhos e a locais propícios, para atacar os militares portugueses.
O BC 96 do T.Coronel Maçanita e a Compª de Cavalaria do Cap Abrantes chegaram a Nambuangongo e o BC 114 não chegou. Parabéns aos Heróis!
Que grande humilhação para o BC 114!!!
A “guerra de capoeira” do Estado Maior versus não Estado Maior, referida na publicação, infelizmente terá sido real e verdadeira, mas cuidado! O maior erro esteve na avaliação ou falta dela, no que se refere às capacidades e objectivos do IN. Os planificadores da operação aceitaram como boa a ideia de que o itinerário central, por Lifune, Quicabo, Balacende, Quissacala, Beira Baixa, Águas Belas, Onzo era o itinerário mais curto e directo, logo o mais fácil e rápido. Só que o IN pensou da mesma maneira e dirigiu para aí a sua principal resistência. Recorde-se o Combate de Quicabo e as suas circunstâncias e consequências: estavam ali combatentes da UPA de todos os comandos da região incluindo Nambuangongo, e Quipedro que fica a norte daquela vila. Ali morreram, sem dúvida os melhores e grande quantidade de combatentes da UPA, o que foi reconhecido pelo próprio IN. Veja-se neste blog o post sobre O Combate de Quicabo.
Também aqui, na referência ao Combate de Quicabo há uma expressão que não é correcta. Afirma-se na página 9 que, cito: “até que os militares da frente conseguiram fugir aos guerrilheiros…”. Isto não é verdade! Nenhum dos nossos militares fugiu a quenquer que fosse. Bem pelo contrário, todos se mantiveram firmes e audazes na luta corpo a corpo utilizando as baionetas das suas espingardas, algumas das quais ficaram dobradas e não perdemos nenhum material, (armamento ou munições), embora esse fosse um dos principais objectivos do IN - capturar material.
Respeitemos a memória dos que morreram lutando! Estes foram talvez "os únicos mortos em combate" durante toda a guerra de Angola. A luta corpo a corpo foi uma realidade, repito para que conste da história.
A propósito e sobre este mesmo assunto transcrevo um desabafo bem espontâneo e revoltado do Camarada VALHOR, radiotelegrafista do 2º Pelotão que seguia na frente e sofreu o choque do combate com toda a violência. Aqui ele corrige outro pormenor, embora de menor importância: quem acorreu à frente em auxílio do 2º Pel foram os homens do 3º Pel que íam em segundo lugar na coluna e não o 1º, como erradamente consta do Arquivo Militar.
Diz o VALHOR:
"No Anexo II, Pág. 8 e 9 "EMBOSCADA QUE ATRASOU O BATALHÃO DE CAÇADORES 114, refere: "..... o ataque durou entre 15 a 20 minutos. Até que os militares da frente conseguiram fugir aos guerrilheiros e os de trás puderam fazer fogo".Como assim???:O 2º.pelotão, não obstante ter sofrido 6 mortos e 14 feridos, manteve-se firme na frente lutando heroicamente corpo a corpo com o "IN" e protegendo os seus feridos e os corpos dos seus mortos, até à chegada do 3º. pelotão que vindo imediatamente da retaguarda ajudou a desbaratar os emboscados. O "IN" deixou no local centenas de mortos dos seus melhores guerrilheiros.Se o 2º. pelotão tivesse fugido!!! o "IN" ter-se-ia apoderado das armas dos n/mortos e feridos, o que não aconteceu. Este episódio está muito mal contado. Propositadamente ou não, não sei. Foi relatado certamente por quem não esteve lá! "
Voltando ao atraso do BC 114, é necessário dizer o seguinte:
O dia “D” para a operação não foi o mesmo para todas as unidades: enquanto o BC 96 tem o seu dia “D” a 10 de Junho no Úcua, (que talvez seja bom não recordar as correntes de Quissacala da Pedra Verde), o BC 114 só terá o seu dia “D” a 15 de Julho, a partir da Ponte do Lifune. Portanto mais de um mês depois.
Por outro lado o T.Coronel Maçanita refere que se meteu atrás das auto-metralhadoras do Pel CAV e ala para Nambuangongo!
Muito bem, o BC 114 chegou até à Beira Baixa sem qualquer reforço de Cavalaria ou auto metralhadoras. Apenas recebeu o reforço do Pel Cav comandado pelo Alferes Marinho Falcão e não pelo Manuel Monge, como erradamente consta da publicação, quando já estava nessa Fazenda, depois de ter sofrido emboscadas de grande resistência do IN.
Os “heróis” e os “bobos”
Os heróis fazem a história, os bobos contam-na e os historiadores interpretam-na.
Sem desmerecer dos feitos do BC 96 e seus heróis, não posso deixar de lembrar aqui um pequeno episódio bem esclarecedor: O Combate de Quicabo, em Quanda Maúa, a 5 quilómetros do Lifune, em 15 de Julho de 1961 foi a maior tragédia em que me vi envolvido em toda a minha vida!
Aí por Outubro de 1961, numa patrulha que fiz à retaguarda, vim encontrar um camarada, comandante do Pelotão que fazia a segurança da Ponte do Lifune, obra de arte recuperada em madeira e fundamental para garantir as comunicações rodoviárias, completamente acagaçado e aterrorizado, dirigindo-se-me nestes termos e a tremer: “ó C…..(Noca), eles estão muito longe?” Eles era o IN. Omito o nome do camarada por motivos óbvios.
Em finais de 1963, estando colocado na E.P.I., um dia entrei na Sala de Oficiais e deparei com quase todos os oficiais da unidade, dispostos em círculo e assistindo ao relato de uma guerra, (batalha), em Angola, produzido por um camarada que se desdobrava em gestos de ataque e defesa, descrevendo cenas inauditas de terror e morte, com luta corpo a corpo e catanas e baionetas e depois a bazooka e a MP Breda, etc, com um realismo tal que todos viviam aquele espectáculo de horrores. Eu próprio fiquei admirando aquela narrativa, até ao momento em que verifiquei que a estória que ele contava não era dele, mas antes a que a minha CC 115 tinha vivido no dia 15 de Julho, a 5 quilómetros da Ponte do rio Lifune. Este camarada era o mesmo que encontrara acagaçado na Ponte do Lifune em 1961.
Luta Corpo a Corpo
Os relatos produzidos na publicação sobre este assunto parece não condizerem com os do Alferes Miquelina que foi do BC 96, o qual afirma algures no seu blog que “isso de luta corpo a corpo, nunca existiu na Guerra de Angola!”, cito de memória.
Pelos vistos a guerra do Alferes Miquelina não foi a mesma que os elementos do BC 96 fizeram e relataram para o autor do livro. Vejam lá se se entendem! O Alferes Miquelina também era do 96.
Outra inverdade
Na página 16, cito: "O Batalhão 114 continuava acantonado na zona de Quissacala - onde seria reforçado por um pelotão de Cavalaria comandado pelo então alferes Manuel Monge."
Saberá o autor o significado da palavra "acantonado"? Certamente que não. Poderia haver acantonamento em Luanda, no Caxito, onde a CC 115 esteve acantonada 10 dias, até talvez em Nambuangongo, mas nunca em Quissacala. Por outro lado o Pelotão de Cavalaria só chegou ao BC 114 quando as Companhias 115 e 117 já estavam na Beira Baixa e era comandado pelo Alferes Marinho Falcão e não por Manuel Monge.
Se a heroicidade de uma unidade se medisse pelo número de baixas sofridas (mortos e feridos) ou pelo número de baixas causadas ao IN, aí provavelmente a história era diferente e os rankings do BC 96 e do BC 114 teriam uma interpretação diferente.
Mas isto não é uma compita de quem mais morre ou quem mais mata. Eu, por exemplo, nem sei se matei alguém, o que ainda assim, não traquiliza a minha consciência. A guerra é coisa suja!!!
Não quero terminar este post sem fazer referência ao serviço de saúde e apoio aos feridos em combate, no caso em apreço agravado pelo facto de o Furriel Enfermeiro ter sido um dos primeiros mortos. Houve necessidade de lançar mão de todos e todos foram "socorristas e maqueiros", procedendo à evacuação dos feridos para a retaguarda em condições verdadeiramente precárias.
Mas demos voz ao Camarada Valadas Horta que me fez chegar o seguinte trabalho.
...MVHorta disse:
"No comentário ao post "Combate de Quicabo", falei pouco do trabalho desenvolvido pelo médico da CC 115 Tenente Miliciano, Augusto Correia Simões.
Quem sou eu para falar da aflição ou quiçá da presença de espírito do Dr. Simões referente ao episódio de Quanda Maúa?
Sei, contudo, que o seu "braço direito", o enfermeiro João Maria Certo Loureiro, furriel miliciano, que ia sentado a meu lado num jeep, foi um dos primeiros mortos na emboscada. Foram disparados contra ele, dois tiros de canhangulo.
O Dr. Simões teve que enfrentar esta dura realidade com os maqueiros e "socorristas", pessoas cheias de boa vontade mas sem qualidades básicas que exigem necessariamente aprendizagem.
Na presença de 6 mortos e de 14 feridos, alguns dos quais com gravidade, as coisas, neste clima de guerra campal, não se tornaram nada fáceis de resolver, pois, o número de feridos era elevado para que fossem prestados adequadamente os primeiros socorros; havia que saber qual das vítimas deveria ser socorrida, em primeiro lugar e foi quase inevitável a existência de uma certa demora na prestação do auxílio imediato que se impunha.
Por razões óbvias e sem um tipo de "farmácia portátil", este tipo de assistência foi prestado sem qualquer equipamento ou material adequado. Além disso, é sempre imprescindível o conhecimento da técnica de aplicação de ligaduras, talas e torniquetes, massagens cardíacas e outras medidas de urgência ajustadas a cada caso, até os feridos serem devidamente assistidos pelo médico.
É confrangedor assistir ao estado de agitação e de aflição dos feridos nestas circunstâncias. Neste caso, os feridos clamam pelas mães, pelas namoradas e pelas pessoas que lhes são mais queridas, dado o seu estado de ansiedade. Perante uma situação desta natureza, os presentes condoem-se mais com o estado dos feridos do que propriamente com os mortos. Ocorre-me que, um dos feridos graves com hemorragias provenientes do corte de artérias, o sangue saía-lhe em jactos (hemoptise?) correspondentes às pulsações do coração e foi necessário evitar o "estado de choque", (Este nosso companheiro, ferido gravemente, com perfurações nas costas, provocadas por catanadas, inacreditavelmente, sobreviveu, felizmente).
O médico da "115", Dr. Correia Simões, teve muito trabalho nesse dia!"

CC 115 em Quicabo a Guerra continua.

Apesar de abertos os itinerários até Nambuangongo que já permitiam o reabastecimento, incluindo a civis, para reposição da actividade económica da região, no Outono de 1961, o IN continuava a manifestar-se com tiros esporádicos e à distância, sobretudo na zona de Baixa das Palmeiras e Sete Curvas, locais muito propícios a emboscadas e favoráveis aos guerrilheiros.
O Comando determinou a execução de uma operação a duas Companhias (115 e 117), para bater a zona Nor-Nordeste de Quicabo, (montes Quiunenes), caracterizada por orografia muito acentuada, atingindo a cota de 800 metros no ponto mais alto, o N’Zoa. Além de orograficamente muito difícil o terreno é fortemente florestado.
A CC 117 entrou pelo lado poente. Cachila e Birila e a CC 115, pela Baixa das Palmeiras, subiu a íngreme encosta Leste, até ao alto do N’Zoa.
Trilhando caminhos indígenas lá fomos subindo, encontrando aqui e ali vestígios de presença e actividade humana, nomeadamente lavras de mandioca e algumas palhotas, habitações dos agricultores,
Já em pleno planalto dos Quiunenes a testa da coluna foi surpreendida por um tiro isolado de canhangulo, que não atingiu qualquer militar: ter-se-á tratado de algum vigia que com o tiro avisou as populações por si controladas, para fugirem. Efectivamente encontrámos depois uma pequena povoação de palhotas completamente abandonadas, mas com vestígios de presença humana recente. Além deste episódio a Companhia não teve mais contacto com o IN nem com populações, caracterizando-se a operação pelo desgaste físico e psíquico que causou no nosso pessoal, devido ao acidentado do terreno e imprevisibilidade da situação que, a cada momento, poderia descambar para qualquer situação de ataque.

Aviões ligeiros na pista de Quicabo em 1967, portanto seis anos depois da nossa estadia.
Tem interesse por ter em fundo os montes M'Zula ao perto e o N´Zoa ao longe.

Local de captação de água no Rio Lifune. Foto também muito posterior.

Um aspecto dos montes Quiunenes em foto aérea.

Outro aspecto dos Quiunenes, cujo pico mais alto é o N´Zoa.
PS - Não posto fotografias da época por não ter nenhuma alusiva a esta operação, mas as da subida ao Quibaba na Beira Baixa poderão repetir-se aqui, com o pessoal a transportar o armamento e equipamento individual e ainda os meios de transmissão e respectivos acessórios