domingo, 27 de julho de 2008

CC 115 - SETE CURVAS

Avanço para Quicoche-Mimbota (SETE-CURVAS) 27 a 31 JUL61
Após dois dias em Quicabo a CC 115 recebeu ordem para, integrando uma coluna constituída por duas companhias de caçadores (CC 115 e CC 117), reforçadas com Can S Rec, Sapadores e um buldozer D-8 e apoiada pela Força Aérea, abrir o itinerário para norte, a caminho de Balacende.

Sabia-se, e o PV2 da FAP confirmou, que a picada até Quicoche estava repleta de abatizes e valas.
Saída de Quicabo ao romper da manhã, cedo começaram os obstáculos na picada: eram árvores enormes e tantas que o buldozer e as motos-serra não tinham descanso, e a progressão era a passo de caracol.
Percorremos lentamente a "baixa das palmeiras", um vale repleto de grandes palmeiras, ao longo do qual, ladeando a linha de água pelo sopé da encosta adjacente à direita, se desenvolvia a picada estreita e repleta de abatizes, que iam sendo removidas pelo D-8 e motos-serra dos sapadores.
De tal modo que passadas dez horas de progressão, teríamos avançado uns seis quilómetros.

Eram cerca das cinco horas da tarde e o sol caía no horizonte, ali muito limitado devido à proximidade dos montes Quiunenes, onde sobressai o N'ZOA, quando a testa da coluna entrou numa zona de ravina e progrediu através de uma encosta sinuosa, com talude alto na direita.
A máquina terra planadora ia à frente retirando as abatizes, sempre protegida por atiradores apeados. O local chama-se SETE CURVAS e é especialmente propício para nele fazer emboscada. A coluna era muito grande, não cabendo toda na zona de morte. Por isso o inimigo, aguentando até ao máximo, deixou que a testa da coluna ultrapassasse a equipa de detenção à frente e só atacou, quando o maior número de viaturas estava na zona de morte.
A secção de atiradores que fazia a segurança do buldozer chegou a estar a menos de cinco metros dos combatentes emboscados, sem que estes reagissem, demonstrando grande disciplina na actuação.
Desencadeado o ataque, em circunstâncias de grande vantagem para os combatentes inimigos que dominavam toda a extensão da coluna, sem possibilidade de serem desalojados das valas longitudinais que haviam preparado, valeu às nossas tropas a forte reacção de fogo de tiro tenso, embora em inferioridade posicional.
As granadas de mão não puderam ser utilizadas devido à densidade da vegetação. As que foram lançadas não explodiam porque eram amortecidas pela vegetação, ou, na pior hipótese, vinham cair sobre as viaturas com grave perigo para as nossas tropas. No final da refrega o inimigo retirou, depois de ter causado um morto e vários feridos ligeiros, quase todos por zagalotes. Recordo que no Unimog em que eu seguia sentado na caixa do mesmo, no meio da secção de atiradores, verificaram-se três feridos com zagalotes: dois na região dos ombros de frente e outro no pescoço, junto das cervicais, felizmente sem gravidade. Eu fiquei no meio do tiro porque um dos feridos ía à minha direita, outro à minha esquerda e o outro à minha rectaguarda, de costas para mim pelo que foi atingido na parte posterior.
Entretanto fazia-se noite e a coluna teve de sair rapidamente da zona de morte e estacionou 500 metros à frente, onde surgiu um local propício, mesmo em Quicoche.

O meu pelotão seguia na vanguarda e foi portanto o primeiro a sair da "zona de morte" e a atingir o ponto que pareceu adequado ao acampamento, pelo que em acordo com o Comandante da 117, Capitão Marques Pereira, se decidiu começar a limpeza do terreno fortemente ocupado de capim e arbustos altos de toda a espécie. O D-8, buldozer, abria uma clareira e logo era ocupada com uma viatura e assim sucessivamente até instalar todas as viaturas e seus ocupantes.
Ali se fez imediatamente um círculo com as viaturas viradas para o exterior, para eventual iluminação da periferia/campo de tiro durante a noite, com os faróis das mesmas, em caso de ataque nocturno.

Nessa noite já não foi possível fazer o reconhecimento da área da emboscada e arredores, devido à total falta de visibilidade. Tal só aconteceu no dia seguinte, verificando-se a existência de uma exemplar organização do terreno, sendo encontradas valas para abrigo dos atiradores ao longo de todas as sete curvas e recuperadas bastantes munições e invólucros de balas, abandonados pelo inimigo em fuga. Encontrámos ainda muitas granadas ofensivas por detonar que haviam sido lançadas pelos nossos militares, mas não rebentavam devido à ausência de choque por serem amortecidas na queda pela vegetação densa existente. Era uma granada canadiana, de plástico, que rebentava por choque.

Pela dimensão do terreno organizado, pudemos concluir que a emboscada estava preparada para um grande número de combatentes e pode seguramente presumir-se que o seu número foi substancialmente diminuído, por terem morrido muitos no Combate de Quicabo, em Kuanda Maúa.

No dia seguinte, o 3º Pelotão da CC 115 foi em patrulha a Quicabo levar o morto e os feridos, que, embora ligeiros, precisaram de assistência sanitária específica que não podiam receber na frente.
Nos três dias que se manteve em Quicoche, a força limpou a zona, nomeadamente localizou um acampamento abandonado pelos guerrilheiros, onde ainda havia camas, (sítios para dormir), comida recentemente confeccionada e outros vestígios denunciadores da grande utilização recente. Era a base de apoio dos guerrilheiros enquanto preparavam o terreno no local da emboscada.
É oportuno transcrever aqui um extrato do Relatório Oficial relativamente a este assunto:
"(3) Em 30, foi realizada uma operação de limpeza pela CC 115 na região a Sul das SETE CURVAS, tendo verificado a forte organização, donde o In realizou a emboscada. Foram localizados os itinerários de aproximação muitíssimo bem camuflados e recuperaram-se envólucros de cartuchos de 9, 7,9 e 10,5 mm. De salientar, seguindo um trilho, foi encontrado escondido numa árvore, um lote de medicamentos, que, concerteza, os terroristas não conseguiram recuperar, na precipitação da fuga.
Nesse mesmo dia, a CC 117 fez o reconhecimento do itinerário de Balacende até ao desvio para MIMBOTA, encontrando apenas vestígios de pegadas de pé descalço e sapatilhas, na picada."

Foi ocasião para uma foto do 3º Pelotão quando acabava de regressar de uma patrulha pela região.


Com a devida vénia, não resisto a colocar uma descrição na primeira pessoa, que fui pescar ao blog do VLHORTA.

"Sete Curvas
O local das Sete Curvas (em pouco mais de 100 metros), era o sítio ideal para uma emboscada às nossas forças.Estrada a serpentear à beira de uma ravina. Do lado oposto à ravina, numa zona alta, no sentido Cacuaco – Beira Baixa – Nambuangongo, lá estava o IN abrigado em trincheiras, à nossa espera!Nesta emboscada “a das Sete Curvas”, 27Jul?, por força das circunstâncias, fomos obrigados a acampar e a pernoitar no sopé de um morro imediatamente a seguir à última curva (7ª.), por entretanto ter anoitecido e por termos sofrido 1 morto e 2 ou 3 feridos graves que careciam de evacuação rápida.

O local do acampamento era paupérrimo, de mata cerrada, mas não deixando ao Comandante outra alternativa que não fosse a de determinar que a máquina que nos acompanhava, buldozer, “terraplanasse”o sítio onde pernoitámos. Foi um trabalho exaustivo atendendo a que um pouco antes tinha havido um confronto com o IN.

Eu sei que nessa noite descansei um pouco sobre uma manta que estendi por debaixo do jipão das transmissões até cerca da meia-noite, altura em que fui acordado, por ordem do comandante, a fim de transmitir em morse, uma mensagem cifrada (RI).

A transmissão da mensagem em morse garantia uma maior segurança ao seu conteúdo e minimizava a ocupação do espectro de radiofrequência e também porque a propagação do sinal rádio em fonia era ténue devido a problemas relacionados com o comprimento da antena horizontal, instalada no exíguo espaço existente entre o jipão das transmissões e o ramo de um embondeiro que lhe servia de suporte.

Na transmissão dessa mensagem, ajustei a mola da chave de morse à coxa da perna direita e à luz de uma lanterna, tapado com uma capa para impedir que fosse visto pelo IN, o qual poderia eventualmente ter permanecido naquele morro muito alto que se situava ali bem perto e em local privilegiado para disparar dali uns tiros que atingissem o alvo, neste caso, a minha pessoa.

Enfim, depois de tudo isto, o Relatório Imediato lá chegou ao destinatário que o aguardava com alguma ansiedade. Um alívio para o Comandante e uma honra para mim; esgotado, mas consciente do dever cumprido; a seguir fui descansar.

Por vezes interrogo-me: Terá o Comandante descansado alguns minutos naquela noite? Estou em crer que não porque o dia seguinte foi também de trabalho intenso e a noite já era longa."

Nota do bloger: Caríssimo Horta nem o Comandante nem os outros porque o ambiente não era nada propício, como muito bem dizes.

quinta-feira, 24 de julho de 2008

CC 115 - Em Quicabo


Kuanda Maúa não era um ponto estratégico importante que merecesse ficar ocupado, mas apenas um ponto de passagem onde, episodicamente, houve necessidade de a tropa permanecer por algum tempo, primeiro como testa de ponte para permitir segurança aos trabalhos de reconstrução da Ponte sobre o Lifune e, num segundo tempo, para recuperação a seguir ao "Combate de Quicabo".


Obtidos esses dois objectivos, em 24 de Julho de 1961, A CC 115, integrando uma coluna militar que incorporava o Comando do BC 114, saiu de Kuanda Maúa em direcção a Quicabo, onde chegou por volta do meio dia, onde já se encontrava, há três dias, a CC 117. A progressão da coluna desde Kuanda Maúa até Quicabo foi apoiada pela Força Aérea. A fotografia supra documenta essa acção precisamente no ponto de partida da coluna militar.


Este apoio foi fundamental para o bom desenvolvimento das operações, não só pela intervenção armada utilizando as armas a bordo das naves aéreas, mas de um modo especial pelas informações que vinham do ar. Aí os nossos radiotelegrafistas foram de uma total eficiência estabelecendo as ligações e recolhendo as informações preciosas para cada momento.




Depois da Bandeira Nacional içada sobre as ruínas da casa do Chefe de Posto, aqui foi instalado o Comando do BC 114, designado por FORTE DE QUICABO








Uma foto informal depois da chegada a Quicabo, frente ao único edifício não totalmente destruído: O Posto Médico.


Finalmente podíamos cozinhar alguns géneros sêcos, nesta cozinha improvisada.


A operação da colheita da água era muito arriscada e exigia uma vigilância permanente. Aqui, um apontador de metralhadora mantem a segurança ao grupo que recolhe água no Lifune, perto de Quicabo.

Elementos do 3º Pelotão recolhendo água no Lifune, junto a Quicabo, com as armas por perto e sob a protecção do vigilante apontador da ML Dreyse, ajudado pelo canídeo para dar o alerta.


O Excesso de Confiança podia ter sido fatal
O excesso de confiança não é bom conselheiro, como se verá.
O baptismo de fogo sete dias antes em Quanda-Maúa, dera ao pessoal um sentido de descompressão tal, que, ao chegar àquilo que fora uma povoação muito populosa e agora eram uns restos de palhotas queimadas e um Posto Administrativo em ruínas, cercados por lavras de mandioca, alguns resolveram fazer um reconhecimento pelos arredores.
Os cabos "RDs" que haviam feito comissões na Índia e em Macau, foram os primeiros a avançar para a exploração. As refeições não eram abundantes e a fome convidava à procura de alternativas. Encontraram uns frutos secos que os "experientes" cabos "RDs" disseram ser iguais a outros que eles haviam encontrado na Índia e eram comestíveis.
Após e ingestão descontrolada do referido fruto seco, mais de metade da Companhia entrava em estado de perigosa intoxicação, entrando uns em estado comatoso, outros com paralisias parciais. Valeu na altura, a pronta e criteriosa intervenção dos médicos do Batalhão e Companhia, que aplicaram os vomitórios e anti-tóxicos disponíveis.
Mas o cómico, no meio do infortúnio, foi que, ao fazer a chamada da Companhia para verificação das faltas, no 3º Pelotão faltava o corneteiro, por sinal o melhor corneteiro do Batalhão, (era um prazer acordar ao som da alvorada tocada pelo Manuel Lopes Marinho, assim se chama o nosso querido corneteiro que é de Fervença - Celorico de Basto).
Procurado o corneteiro do 3º Pelotão, veio o mesmo a ser encontrado inanimado, por detrás de um "embondeiro",(sempre um embondeiro).
Retirado o homem, qual não foi o espanto quando surge no mesmo local, enrolada e quietinha, uma perigosa "surucucu". E agora? De que sofrerá o corneteiro? De intoxicação alimentar por ter ingerido frutos tóxicos, ou de envenenamento por picada da surucucu?
Sendo-lhe aplicada a mesma receita que aos outros, reagiu bem igualmente e recuperou. A surucucu deve ter gostado do calor do corpo do corneteiro e não lhe picou, ou então ao mordê-lo, já intoxicado, também ela ficou sonolenta e adormecida.(?!!!)
A verdade é que a CC 115 estava operacionalmente recuperada do embate sofrido em Quanda-Maúa e agora, recompletados os seus efectivos, estava pronta para avançar rumo a Nambuangongo, como exigia o planeamento das operações.

· SURUCUCU- víbora africana de veneno mortífero


Depois de muito trabalhinho o acampamento, "Forte de Quicabo" ficou um brinquinho! Pronto para receber a época das chuvas!



Vista de Quicabo a partir da elevação M'Zula que lhe é sobranceira. Ao fundo vêem-se os montes de Birila.
Neste espaço, relativamente plano, deu-se, em breve, início à construção da pista para pequenas aeronaves, para garantir o transporte de pequenas cargas e evacuação de feridos.

quarta-feira, 23 de julho de 2008

CC 115 - Kuanda Maúa -Recuperação

Durante os oito dias passados no acampamento de Kuanda Maúa o pessoal da CC 115 não ficou imobilizado, bem pelo contrário a actividade operacional foi acelerada com o lançamento de patrulhas quer na direcção de Quicabo, consolidando o avanço da 117, quer na direcção da Ponte do Lifune, quer ainda pelos arredores em reconhecimento da área.

GOLPE DE MÃO À FAZENDA "MACAPI"

Por informação dos guias soube-se da existência de uma fazenda nas redondezas de Kuanda Maúa, pertencente a um cidadão italiano de nome PIRELLI.

Foi então planeado e levado a efeito pela CC 115 (-) um golpe de mão de modo a surprender possíveis elementos inimigos ou vestígios da sua presença, que ali se encontrassem.

Feita a aproximação em viaturas, os últimos dois quilómetros foram feitos a pé e o mais discretamente possível.

Concluída a operação que decorreu sem incidentes, verificou-se que a habitação estava intacta, apenas se notando buracos nas paredes, donde haviam sido extraídas as canalizações com o fim de fabricar canhangulos. De resto, mesmo alguma mobília estava intacta.



Esta actividade quase permanente, muito contribuiu para a recuperação efectiva do pessoal, cujo moral estava no melhor nível.

segunda-feira, 21 de julho de 2008

CC 115 - Em Recuperação

Durante os dias passados no acampamento situado na base do morro Kuanda Maúa, o pessoal da CC 115 aproveitou para recuperar das grandes emoções e terrores que, naturalmente os afectaram no acto do combate. As noites que se seguiram foram, de facto intranquilas devido aos ruídos estranhos que se ouviam na floresta próxima, tudo parecendo que eram elementos atacantes que se aproximavam: em intervalos curtos de tempo, os faróis dos carros eram acesos para examinar o campo de tiro.
Nos tempos mais ou menos livres, aproveitou-se para dar uma vista de olhos pelos arredores, subindo o morro de Kuanda Maúa até às posições da 116 e à crista topográfica do monte. Além disso houve tempo para pensar nos familiares e enviar um aerograma para este ou para aquele, ou aquela, conforme as situações.
Segue-se um bate estradas que escrevi em Kuanda Maúa a 19 de Julho, pois tem o carimbo de 21 no Caxito. Foi escrito à pressa com a justificação de a patrulha estar mesmo a sair, mas a verdadeira razão foi que não tinha assunto para transmitir, ou melhor tinha, mas não queria transmitir o que ía na alma.
Desculpem-me pôr aqui este aspecto pessoal, mas é mais um testemunho. Quantos não fizeram o mesmo só para ocultar aos pais os maus bocados que estavam passando.

No dia 19 recebi correio e nesse mesmo dia a 117 avançou para Quicabo sofrendo uma emboscada, de que resultaram 3 baixas: dois mortos e um ferido.
No dia 20, o 3º Pelotão fez uma patrulha até ao acampamento da 117 e esta Companhia avançou para Quicabo onde chegou sem mais contrariedades. O regresso ao acampamento de Kuanda Maúa decorreu sem novidade.
Em 21, ataque perigoso do Quissondo, (perigosas formigas que destroem tudo quanto é comestível).
Em 22, nova patrulha a Quicabo e à Ponte do Lifune. Neste rio aproveitei para lavar a cara, diz o meu diário, e descalcei as botas, o que não fazia há 12 dias.
Na passagem pelo Embondeiro Grande, o cheiro dos corpos em decomposição era insuportável, aliás já chegava ao acampamento de Kuanda Maúa. Para aliviar e suportar esta circunstância faziamo-nos acompanhar de laranjas, que, cortadas ao meio, colocávamos sobre o nariz a fazer de máscara ou filtro. Só passada uma semana as equipas de limpeza terão actuado no local.

CC 115 - "COMBATE DE QUICABO" na Op.VIRIATO

Se a Operação Viriato foi a mais complexa e de maior duração em toda a Guerra de Angola, entre Fevereiro de 1961 e Abril de 1974, o "Combate de Quicabo", em Kuanda Maúa, foi o episódio mais importante de toda a Operação Viriato.
O "Combate de Quicabo", alem de ser a última vez que os insurrectos se atreveram a atacar em massa, com tão grande número de combatentes, ele determinou uma alteração decisiva no modo de encarar a guerrilha pelos independentistas.
A UPA sofreu ali o seu maior revés, perdendo a maioria dos seus melhores combatentes, o que aliado à efectivação da ocupação de Nambuangongo e abertura dos respectivos acessos, empurrando os guerrilheiros definitivamente para a mata, contribuiu definitivamente para que o peso da balança pendesse para o MPLA, organização melhor preparada sob o aspecto ideológico e preparada para uma guerrilha por tempo indeterminado.
Isto é, os Independentistas da UPA que já alardeavam a posse de um território dentro de Angola viram-se despojados desse território, refugiando-se em pequenas bolsas no interior da floresta, sem poderem apresentar qualquer povoação em seu poder, limitando-se a montar emboscadas em pontos estratégicos das picadas, onde gozavam da superioridade da surpresa e do conhecimento do terreno. Tinham, no entanto dificuldades de abastecimento, nomeadamente em sal e pólvora, testemunhadas por documentos encontrados no evoluir das operações.
O MPLA, mais implantado na sociedade civil angolana, teve a sua oportunidade de dar o salto qualitativo da guerrilha na direcção de novas formas de actuar, nomeadamente com novas armas que viriam a tornar-se fatídicas para a tropa portuguesa, as minas.

quarta-feira, 16 de julho de 2008

CC 115 - "COMBATE DE QUICABO" Ressaca/Recuperação

Após a tempestade, vem a bonança!
Foram momentos trágicos os vividos na manhã do dia 15 de Julho em Kuanda Maúa e já relatados.
Felizmente não houve fotografias para documentar os acontecimentos, mas podemos garantir que não houve cabeças espetadas em paus à beira dos caminhos. No BC 114 não era permitido actuar dessa maneira, embora possa não ter sido dado aos mortos do inimigo o mesmo tratamento que demos aos nossos.
Nas horas que se seguiram, fez-se a recuperação das viaturas afectadas pelo ataque inimigo e, pelo meio da tarde, a CC 115 abandonava, com todo o seu pessoal e material, o local do combate, indo acampar na base do morro denominado Kuanda Maúa, à beira da picada, partilhando o espaço com a CC 117.
Ali se passou a noite, cada um como pode: uns debaixo, outros ao lado, outros sobre as viaturas colocadas em círculo com as frentes para fora. Os condutores dormiram nos seus locais de condução para, em caso de alerta de ataque do exterior acenderem as luzes a fim de iluminar o campo de tiro. Cada secção de caçadores, mantinha uma vigia de sentinela.
A noite passou sem sobressaltos, a não ser os ruídos nocturnos da floresta: os animais noctívagos e os necrófagos, não se fizeram rogados e começaram de imediato os seus festins de orgia selvagem.
Ao acordar no dia seguinte, dezasseis, recordo perfeitamente a imagem algo confusa e desolada de quase todos, a comentar factos em que parecia nem queriam acreditar, mas que tinham sido bem reais. Ali estava o atrelado de 3/4 ton cheio de canhangulos, catanas e outras armas recolhidas após a refrega.
Deu-se entretanto um fenómeno curioso: talvez por termos visto os corpos mortos do inimigo e termos capturado aqueles troféus de guerra, ali presentes, o espírito de corpo que antes já era forte, reforçou-se ainda mais e todos começaram a dar força a todos - tinha sido o nosso baptismo de fogo e , por sinal, bem cruento e isso estabeleceu entre todos como que um pacto de sangue.
Daqui para diante nada será como dantes! Por sugestão dos condutores auto as viaturas passaram a ostentar uma flâmula espetada num pau, e a 115 passou a ser a Companhia das Bandeirinhas - "AD OMNIA PARATI!"

Nota do Bloguer -Não resisto a incorporar no blog o comentário deixado na respectiva caixa por MVHorta, pela sintonia que revela com a última parte do post anterior.

MVHorta disse...
À hora do pequeno almoço do dia 14Jul, a CC 115, era constituída por 180 militares:Comando=26; Pelotão de Comando=40; 1º.Pelotão=38; 2º.Pelotão=38; 3º. Pelotão=38.

No dia 15Jul, a CC 115, sofreu 20 baixas: faleceram em combate 6 militares e ficaram feridos 14.

No dia 16Jul, à hora do pequeno almoço (simbólico), não obstante o vazio que se fazia sentir, éramos os mesmos 180!Houve mais baixas durante a Campanha.Os corpos dos militares mortos, inacreditavelmente, ficaram por lá (Angola)!

Hoje, e enquanto um de nós estiver vivo, seremos exactamente os mesmos 180 !!!
Quarta-feira, 16 Julho, 2008


HOMENAGEM AOS MORTOS DA CC 115
Homens da "115"
Os homens da “115” viveram emoções, ansiedades, tristezas, incertezas, expectativas, medo, mágoas. Sentiram de tudo nessa grande agitação de sentimentos. É que nem todos regressaram. Esses deram o bem mais precioso que possuíam - A VIDA.
Evoco, desde já, o respeito e a saudade, perante a memória de todos esses nossos companheiros que tombaram ao nosso lado.
Publicada por MVHorta

Cemitério de Luanda-Imagem capturada no blog de VLHORTA



PLACA DE HOMENAGEM NA ESCOLA PRÁTICA DE INFANTARIA
Foto cedida pelo 1º Cabo Cifrador Vítor Hugo de Sá

terça-feira, 15 de julho de 2008

CC 115 - "COMBATE DE QUICABO"





Depois de hesitar sobre a designação a dar ao episódio de guerra ocorrido em 15 de Julho de 1961, no sítio de Kuanda Maúa, entre Anapasso e Quicabo, resolvi adoptar este: "COMBATE DE QUICABO", como lhe chamaram os elementos da UPA. Efectivamente não foi uma batalha porque não houve duas forças a enfrentar-se em campo aberto e bem definido para cada parte; não foi um torneio porque não houve mesmo desportivismo nenhum; nem foi uma emboscada no sentido clássico do termo, embora o inimigo surgisse do bosque (floresta), mas onde não tinha qualquer organização do terreno; portanto foi um encontro de surpresa de duas forças em movimento, sem preparação imediata da parte dos dois contendores e assim "COMBATE DE QUICABO" parece-me uma boa expressão, até porque Kuanda Maúa, nome do morro próximo é difícil de dizer.

Como eu vivi e recordo o COMBATE DE QUICABO:
Pelas seis da manhã de 15 de Julho de 1961, junto à Ponte do Lifune, em Anapasso, dada a alvorada começou a preparação acelerada para a partida em direcção a Quicabo. As viaturas já estavam posicionadas na picada e após a preparação individual de cada um, em breve a Companhia estava pronta para partir. Era uma coluna de mais de vinte viaturas, em que se integrava toda a parte operacional e logística. Nas viaturas com tropa operacional, os militares dispunham-se no banco longitudinalmente sentados, de costas com costas, virados para fora e prontos para atirar ou saltar da viatura, conforme as circunstâncias,
Pelas sete horas, quando tudo estava pronto, chegou a notícia, via rádio, que a CC 117 estava a ser atacada no seu acampamento improvisado na base do morro Kuanda Maúa. Esta notícia acelerou mais a ordem de partida, agora com o objectivo imediato de apoiar aquela subunidade do nosso batalhão.
Recordo perfeitamente as últimas palavras que dirigi ao meu pessoal, antes da partida: -ajustem bem os capacetes, armem baioneta, e tomem a maior atenção para os lados da picada, prontos a receber tiros a qualquer momento!
Por uma picada estreita que mal permitia a passagem de uma viatura, ladeada por capim alto que acariciava as cabeças dos militares caindo sobre as viaturas, e seguido de floresta densa e aparentemente impenetrável, percorremos cerca de 4 quilómetros.
A dado momento, junto a um embondeiro muito grande que ficou depois como referência do local, a frente da coluna, depois de sofrer muitos tiros de canhangulos e armas ligeiras, foi positivamente assaltada por vagas sucessivas de combatentes, (ditos então terroristas), da UPA, armados de punhais, catanas, pistolas artesanais carregadas com pequenos ferros, fisgas e, por entre as viaturas, deambulava um ou dois indivíduos, (presumivelmente feiticeiros, ou amestrados por feiticeiros para o efeito), que traziam pequenos sacos com pedrinhas, que atiravam aos soldados, acreditando que se os tocassem eles ficariam neutralizados.

Eu ia numa viatura a meio da coluna e a primeira impressão que tive foi que, de facto havia um ataque, mas não sabia donde vinham os tiros, por isso todo o pessoal saltou para o chão e respondeu ao fogo com a violência possível na direcção da mata.
Só passados alguns minutos houve uma percepção concreta do que se estava a passar e que afinal era um ataque localizado na frente da coluna. Concentrado o esforço nessa direcção, o ataque continuou por muito tempo, sucedendo-se avanços e recuos por parte do In, com grande determinação e violência.

Os nossos soldados bateram-se com grande valor: após responderem a tiro à primeira tentativa de assalto do inimigo, porque não voltaram a poder carregar as suas espingardas mauser, arma de repetição, fizeram uso das baionetas das espingardas, que, neste caso, foram muito eficazes: 3 delas ficaram danificadas devido ao uso que se lhes deu.
Para definição final da contenda muito contribuiram três armas estrategicamente colocadas e que batiam o In com grande eficácia: refiro-me a uma metralhadora Breda instalada num jeep de 1/4 ton, um morteiro 60mm utilizado com grande mestria em tiro quase vertical, pelo Tenente Cipriano Pinto e a Bazooka do Cabo Teófilo.
O In revelou boa organização, com equipas de combatentes e missões bem definidas, devidamente comandados e incitados pelos respectivos comandantes: a uma vaga de canhangulos e armas ligeiras (armas finas, como eles diziam), que visaram sobretudo órgãos sensíveis das viaturas, (depósitos de combustível,radiadores e pneus), seguiram-se os combatentes com catanas e punhais na luta corpo a corpo, incitados por gritos de UPA... UPA...! e Wassa... Wassa! (Na altura interpretámos estes incitamentos como, UPA... UPA....! Mata...Mata, mas hoje sabemos que era antes um incitamento dizendo que as armas portuguesas disparavam água, Wassa em quimbundo). Os combatentes da UPA vinham como que drogados e mentalizados para a luta com ideias erradas sobre as armas dos soldados portugueses, (nomeadamente que estas disparavam água). Isto a acrescer à mentalização feita pelos pregadores, (pastores), protestantes evangelistas, que garantiam a ressurreição dos que morressem em combate, e ainda à acção dos feiticeiros, com forte poder sobre as populações da região.
Outras equipas tinham a missão de capturar material, pois que saltaram para as viaturas e tentaram roubar armas e sobretudo cunhetes de munições, tendo alguns sido mortos quando já transportavam algum material, gorando os seus intentos.
Hoje, não temos bem noção do tempo que terá durado a refrega, mas certamente terá durado mais de trinta minutos, Seguiu-se depois a recolha dos mortos e feridos e respectiva evacuação para a retaguarda, operação que durou bastante tempo, dada a dificuldade de manobra das próprias pessoas apeadas por entre as viaturas, espaço pejado de mortos e feridos, de ambos os lados. Lembro-me especialmente do Durval, completamente nok out e com o capacete rachado por uma catanada certeira e outro, o Carlos Pires, condutor da viatura que seguia na testa da coluna e que levava a seu lado o civil, guia, de nome Álvaro, bem como o furriel Enfermeiro que foi uma das vítima mortais. O condutor Carlos Pires, alvo principal da fúria dos atacantes ficou com as costas abertas, por efeito de outra catanada, desde o ombro até à zona dorsal oposta, por onde saía o pulmão ao respirar. Felizmente qualquer deles recuperou e estão ainda entre nós, os dois condecorados com a Cruz de Guerra.
A recolha e transporte dos mortos e feridos em panos de tenda, até à retaguarda, foi traumatizante e de grande risco para os feridos, porque aos mortos, já nada havia a fazer, senão respeitar a sua memória.
O 2º Pelotão do comando do Alferes Barreto, que seguia na testa da coluna, sofreu, de facto o grande embate e dureza do ataque inimigo, tendo respondido com grande valor e audácia. Ficou, no entanto, praticamente dizimado, pois teve mais de vinte baixas: seis mortos e uns dezoito feridos graves.


O In teve mais de cento e cinquenta mortos, reconhecidos pela própria UPA em documento do Destacamento de Quicabo, assinada por Filipe João Neto, que transcreverei abaixo, alem dos feridos que foram morrendo pelo caminho, como eu próprio tive oportunidade de verificar em reconhecimento passado um mês, em que fui encontrar cadáveres a mais de um quilómetro dali, ainda com os canhangulos por perto. o que parece dizer que não houve recuperação de feridos e muito menos de mortos.




Este é o célebre EMBONDEIRO de Quanda-Maúa, visto de norte para sul, ou seja a CC 115 deslocava-se de lá para cá, que foi testemunha muda dos acontecimentos de 15JUL61.
Repare-se no diâmetro do tronco por comparação com o caminho.
Se pensarmos que nesta “picada”, agora já alargada e limpa de mato até mais de vinte metros para cada lado, podem cruzar-se duas viaturas em movimento, é fácil compreender que o tronco da árvore não terá menos de seis metros de diâmetro.
Pelo mesmo raciocínio concluiremos que a altura rondará os 40 a 50 metros, e que o diâmetro máximo da copa medirá mais de 50.
A seta indica a direcção donde vieram os atacantes que se lançaram sobre as primeiras viaturas da coluna militar, precisamente neste troço visível da picada, que então era um trilho estreito, ladeado por mato e capim alto, caindo sobre as viaturas.
Embondeiro.. De clima tropical,
Xerófila vegetal,
Eu sou !
Eu sou...
De corpo cavernoso
E tronco garrafal
Enorme. Não formoso,
Árido, descomunal,
De ramos levantados,
(Erguidos pr'os céus)
Nus (de folhas despidos),
Rigando preces a Deus
Estou!
Às chuvas, aos ventos...
Titã rofo, rigente,
De andrajos vestido.
Meu fruto, meu rebento,
Em meus braços detido,
Lembra rato pendente
Pelo rabo sustido.
Em campo desolado
De vastidão sem fim,
Meu corpo se ergueu,
Cresceu... cresceu...
E a meu lado o capim.
Que tristeza! Que solidão!
Se me vem... olham... olham...
Miram... remiram e passam.
Desilusão!
Em minha sombra não descansam!
De corpo hirto descomunal,
Informe (por vezes rachado)...
Lanço os meus braços aos céus
E grito! Oh meu Deus
Antes fosse rasteiro
Pasto de animal!
Não! ... serei o que sou enorme...
Alto, disforme...
Até no nome sou enorme...
EMBONDEIRO!... EMBONDEIRO
Eu sou!
IGOR(cópia do Jornal O Dragão nº 2 de Setembro de 1966)


Segue-se agora um relato na 1ª pessoa feito pelo que foi 1º Cabo Radio telegrafista Manuel Valadas Horta

Para memória futura!


OS GRANDES COMBATES NÃO DEVEM FICAR NO ESQUECIMENTO!!!


Que eu tenha conhecimento, não existiu, em toda a guerra de África, entre 1961/1974, outro confronto tão violento. Eu vi! Eu estava lá! O ataque do IN (tal como era considerado nesse tempo) desencadeia-se com grande fúria, na tentativa de massacrar a nossa tropa, lançando um impetuoso assalto na vanguarda da coluna de viaturas. As primeiras vagas de guerrilheiros da UPA, saíram do interior de uma vegetação densa, a coberto de um enorme embondeiro, onde se encontravam emboscados, lançando-se furiosamente sobre os nossos militares, inclusive, saltando para cima das viaturas ainda em marcha, obrigando-as a parar de imediato. Durante o combate, que prossegue, numa luta violenta e de tumulto ensurdecedor, os comandantes de outros pelotões da retaguarda, encorajando os seus homens, acorrem com prontidão em socorro do pelotão da frente que estava a ser massacrado, e é a partir daí que as hostes guerrilheiras começam a fraquejar e são completamente aniquiladas. Um ou outro guerrilheiro, aterrorizado foge a coberto da densa mata. De um pelotão de 38 elementos que seguiam à frente da coluna, eu fui um dos 18 militares desse pelotão que saiu ileso do feroz combate. A batalha foi muito pelejada e encarniçada fazendo lembrar aqueles filmes das lutas travadas entre exércitos medievais. A luta corpo a corpo entre as forças beligerantes foi inevitável, tendo terminado em desvantagem para a guerrilha. A diferença, a meu ver, consistiu no seguinte: De um lado estava uma força organizada e disciplinada embora mal armada; do outro lado, os grupos de guerrilheiros além de mal organizados apenas dispunham de canhangulos artesanais (ao dispararem o único tiro ficavam fora de cena) e de armas brancas rudimentares. Após a confrontação, os despojos daí resultantes, foram os seguintes: 42 canhangulos, centenas de catanas, além de outras armas brancas e, acredite-se ou não de uma fisga, material que deu para encher um atrelado de um jeep, não tendo havido perdas de armamento por parte da CC 115.


-É minha convicção:Que o soldado português é, por índole e formação, avesso a qualquer tipo de violência. Contudo, ao tomar conhecimento ou ao presenciar que alguém agrediu ou tratou o seu semelhante a ponto ou de molde a provocar-lhe a morte, aquele paradigma de não violência cai pela base dando origem a uma revolta interior que não anda longe de aplaudir uma correcção exemplar ao agressor.


-São estes os relatos dos homens que sofreram e sobreviveram aos anos de guerra que lhes roubou parte dos sonhos da juventude. As contingências desta guerra destruíram muitos sonhos e muitos homens tornaram-se incongruentes.
ApitoO apito a que se refere a foto anterior pertencia ao comandante do grupo emboscado no ataque de Quanda Maúa, morto em combate. Guardei esse apito (The AGMECITY - Made in England) como despojo de guerra e ainda o conservo. Foi utilizado para “dar a ordem de ataque”, contra as nossas tropas, tendo-se ouvido o som produzido pelo apito e imediatamente desencadeou-se a luta. O suposto comandante ostentava divisas de cabo miliciano e contrastava na indumentária com os restantes guerrilheiros que se apresentavam mal vestidos, tronco nu, descalços e com lenços brancos atados na cabeça. As vagas sucessivas de grupos IN encontravam-se embrenhadas por detrás e nas imediações do célebre embondeiro referido na foto, onde a mata e o capim atingiam uma altura superior às antenas verticais instaladas nas viaturas. A foto ao local foi tirada depois da zona ter sido limpa.
Publicado por MVHorta.
Nota do Bloguer: Este referido comandante da UPA que usava divisas de cabo miliciano era um tal Manuel Pedro e terá morrido neste combate, porque ao chegarmos a Quicabo ainda estava escrito num quadro de ardósia da escola, o seguinte: O COMANDANTE É (seguia-se o desenho das divisas de cabo miliciano) MANUEL PEDRO. Pelo Chefe do Posto Administrativo de Quicabo foi confirmado que esse tal Manuel Pedro havia servido a tropa portuguesa como cabo miliciano.
Por outro lado verifica-se que em 17 de Julho a carta escrita no Destacamento da UPA de Quicabo para o Pastor do Ambriz é assinada por Filipe João Neto e não por Manuel Pedro, como deveria ser, se este estivesse vivo.
Transcrição de um artigo inserto nas páginas nºs. 34 e 35 do Livro da História da Companhia de Caçadores 116 (28 de Maio de 1961 a 13Jul1966), relatando o ataque de Quanda Maúa:“………….
Nesse mesmo dia (14Jul61) a CCaç.115 chegou a Anapasso com vista a progredir às primeiras horas do dia seguinte à retaguarda da CCaç.117, para a limpeza do terreno e avanço sobre Quicabo.
Combate de Quanda-Maúa.
Às 06.15 h. do dia 15 a CCaç.117 começou a ser atacada por 2 grupos IN, num total de cerca de 80 homens.
b) O alarme foi dado por um tiro disparado pelo IN da mata a E do estacionamento da CCaç.117, sobre um soldado desta Companhia que se afastara um pouco do estacionamento. Este tiro atingiu o praça no pescoço, sem consequências de maior. Foi o primeiro militar ferido na Unidade e, por coincidência, tinha o nº. do próprio Batalhão: soldado 114/60.
c) O ataque foi efectuado por 2 grupos. Um com cerca de 50 homens, com canhangulos e catanas, vestindo calção e camisa azul e com um lenço atado à volta da cabeça atacou de frente, ao longo do itinerário para Quicabo. O outro grupo, de cerca de 30 homens, a maior parte vestidos de caqui (o que levou ao pensamento momentâneo de ser pessoal nosso) atacou em direcção à orla E do estacionamento da CCaç.117.
d) Localizados os grupos a CCaç.117 abriu fogo sobre o primeiro grupo, tendo a maioria dispersado e, posteriormente, juntado ao outro grupo localizado a E.
e) A CCaç.116, que dominava o terreno em redor abriu fogo sobre este grupo provocando inúmeras baixas. São de realçar os efeitos da Metralhadora Pesada Breda e do Lança Foguete 8,9 (Bazooka).
f) Salienta-se que, como sempre se veio a constatar, o IN preocupou-se em levar consigo, na retirada, os feridos e o armamento.
g) Nesse mesmo dia e pouco tempo depois do ataque à 117, a CCaç.115 que se encontrava em Anapasso, recebeu ordem para seguir para a região e, quando estava prestes a atingir Quanda-Maúa, foi surpreendido por um violento ataque lançado por um grupo IN que se dissimulava na mata à direita da estrada.
h) O ataque desencadeado com tiros de canhangulos e caçadeiras, lançando-se imediatamente à abordagem utilizando catanas. Os elementos IN ziguezaguavam entre as viaturas, saltando sobre elas. Alguns dos homens da 115 foram atingidos mortalmente e feridos com gravidade. A CCaç.116, que ocupava uma posição dominante, não podia actuar pois colocaria debaixo de fogo e, portanto, em grande risco os elementos da CCaç.115.
i) Calcula-se que nessa acção contra as CCaç.115 e 117 o grupo IN era constituído por um número bastante superior a 500, na quase totalidade rapazes novos.
j) Foi este o baptismo de fogo do Batalhão 114.
k) …”.NOTA: Segundo alguns cronistas a Operação Viriato suplantou as outras grandes operações dessa mesma guerra. Referem que esta operação foi provavelmente a acção militar portuguesa mais importante não só de Angola mas também de toda a Guerra de África 1961 – 1974 (destacando-se o ataque de Quanda-Maúa).
Segue-se mais um relato na 1ª pessoa, agora do 1º Cabo 12/58, Benjamim Morim
bmorim1 disse...Porque estive nas mesmas datas e locais, pois era o1º cabo apontador da Bazooka do 2º pelotão da C.Caç117.
Fiquei encantado por finalmente ter descoberto na Web alguém a falar do B.C.114 e descrever parte do que eu também vivi. Todos temos uma forma muito pessoal de descrever os mesmos acontecimentos. Dependendo da predisposição e o porquê de nos encontrarmos em determinados locais ( eu fui voluntário para a tropa e para a guerra ), porque neles participamos e não só ouvimos relatos, temos portanto a autoridade de quem viu e viveu directamente nos acontecimentos, para os relatarmos. A minha versão do que se passou, entre o Rio Lifune, ponte ( Anapasso ) e Quanda Maúa, local do 1º combate em que intervieram as tropas do B.C.114 é a seguinte:
A C.Caç.117 deslocou-se de Mabubas a 13 de Julho com destino à ponte do rio Lifune cuja reconstrução estava a cargo das tropas de Engenharia comandadas pelo Tenente Varela. A primeira noite passada a descoberto na mata de Angola houve luta com as formigas terríveis (quissundo). Dia 14 de manhã continuava a reconstrução da ponte mas de forma lenta para ser segura. Chegado ao local o comandante do B.C.114, verificando o atraso na reconstrução, protesta fortemente com o referido Tenente, este e seus homens conseguem até ao principio da tarde desse dia concluir a reconstrução da ponte em madeira por onde passou toda a companhia 117 e seu material de transporte e equipamento logístico e de combate. A poucos kilómetros de distância fica uma pequena elevação cujo local de designa por Quanda Maúa, nesse local e em condição de guarda avançada à reconstrução da ponte estava parte da C.Caç.116 comandada pelo Capitão Velasco, em cujo encontro ao final da tarde do dia 14 com o nosso Capitão Marques Pereira, acordaram passar a noite no local pois era do conhecimento das tropas instaladas que pouco mais à frente havia uma vala na estrada ( picada ) que cabia uma GMC.
Assim foi dada ordem para montar acampamento no local, em forma de meio círculo cuja abertura estava tapada com o morro onde estava instalada a tropa da 116.
Relembro que estávamos todos mal preparados e mal equipados para o que nos esperava, pois, levavamos munições contadas para a Mauser e as granadas de Bazooka e Morteiros encaixotadas além de levarmos também as viaturas carregadas de laranjas do pomar do Lifune. Cerca das 6H00 do dia 15, estava eu ainda deitado no banco traseiro do jipão, ouvi dois tiros e os gritos de terroristas, era o soldado nº114 do 2º pelotão da 117, de nome Américo da Silva Moreira mais conhecido pelo Festas, pois atingido na face e no pescoço até cortou o fio de ouro que usava com uma medalha. Rastejando e com a cobertura do fogo dos seus colegas consegue de novo entrar nas mini trincheiras onde foi socorrido e temos assim o primeiro ferido do B.B.114, em combate. Este soldado tinha-se afastado até junto do arame farpado de protecção para fazer as suas necessidades fisiológicas intestinais. Os terroristas tentavam entrar no nosso acampamento, eram impedidos pelo nosso fogo que entretanto foi reforçado com os morteiros e bazookas que passaram a estar operacionais depois de eu à machadada rebentar os respectivos cunhetes e distribuir as munições. Seguidamente e junto com os meus dois municiadores carregados de granadas e a respectiva bazooka subimos o referido morro e fomos instalar-nos sensivelmente a meia altura, daí tínhamos um campo de visão privilegiado, igual ao de esquadra de Breda a Norte creio que Brauning a Sul, ficando a minha esquadra de bazooka no centro, víamos a movimentação dos terroristas e era fácil para nós atingi-los com tiros certeiros e vermos os estragos que causamos, entretanto sentimos que se aproximavam as tropas da C.Caç.115 que era suposto vir em nosso auxílio. Disso também se aperceberam os terroristas e deslocaram grande quantidade de elementos que fizeram a abordagem ás primeiras viaturas da 115, mas esta parte saberá o meu amigo bem descrever o que foi a carnificina em que lamentamos a morte de seis colegas e ferimentos em quase duas dezenas. Enquanto isto chegaram também os aviões PV2 que metralhavam os inimigos sobre quem lançaram bombas Napal, seguidos dos aviões Fiat que lançavam bombas de rebentação e, dizia-se de fragmentação. A tudo isto assisti e participei numa posição privilegiada pois como disse coloquei-me no morro de Quanda Maúa cuja figura integra as elementos do emblema de B.C.114. Fico-me por aqui, este relato vai longo, mas afirmo que os meus traumas são pela forma como pessoas oportunistas fizeram a descolonização e desrespeitam quem combateu pela Pátria quer queiram quer não.
Ex 1º cabo 12/58
Segue-se cópia da carta enviada por FILIPE JOÃO NETO para um Pastor do Ambriz
"Destacamento da U.P.A em QUICABO, 20 de Julho de 1961
Meu bom Pastor
Ambriz
Os meus respeitosos cumprimentos e melhoras de boa saúde.
Eu bom e são graças a Deus.
Estou em QUICABO no combate, aliás no www distacamento. Fizemos o combate no dia 15, de cujo êxito foi muito mau para nós.Se bem que os inimigos tiveram mais de 60 baixas, nós tivemos de abandonar no campo de batalha mais de 150 mortos, excluindo os feridos. Este é o segredo: agradeço que não diga a mais ninguém. Quero esclarecer-lhe que 60 dos inimigos são os brancos e muito mais número de pretos que estavam arrolados na parte deles. Quer dizer que também tiveram mais de 100 baixas. Três carros foram derrotados. Esses carros encontram-se no logar onde se travou a luta.
Agradeço que apresente os meus cumprimentos à U.P.A de Mufuque.
Uma das suas cartas, na qual disse-me que careciam de sal e sabão, recebi-a a qual me veio encher de grande vulúpia. De que então já tem canhangulos; Parabens.
Quanto a recomendação de pólvora, não sei se poderei arranjar visto que muita foi abandonada no referido combate de QUICABO. Na mesma carta de que já me referi, ainda disse-me que chegou de me escrever por intermédio do Sr. Celestino. Pois digo-lhe que ignoro-a .
Aos Senhores Paim e Assis não deixa de apresentar os meus cumprimentos.
Sempre virei mas presumo eu que será um pouco tarde.
Vossas saudades tem sido a minha dor de cabeça.
Saudades da Nina, Blek e Quinho, saudades da Dona, avó, tia Isabel, tia Juliana, Velho Bembo, etc..
Resta-me dizer que ao invés de uma arma que recebemos aos inimigos quando metemo-nos em fuga, tivemos de abandonar muitas armas de canhangulos e finas.
Naquele combate fomos derrotados porque de todos os bandidos que tem estado em Luanda até à presente data, encontram-se alistados na parte dos brancos; muitos rapazes de Nambuangongo e Dembos dentre esses alguns conhecidos; Chamavam pelo nome dizendo que fugissemos visto que Lumumba é pobre e por esta razão não podemos vencer os Portugueses. A pobreza de que se referiram creio eu que é de material. O comandante de Quipedro resolveu prender todas as mulheres de cujos maridos se encontram actualmente em Luanda. Caso não tenha mulher vai uma pessoa de família.

Abraços e beijos às crianças
Deste que lhe estima e venera
Filipe João Neto
Tenho a lamentar a morte, aliás as mortes de dois tios e de um primo.
Este utimo digo último, morreu no Matoio; um dos tios era enfermeiro em Aparia (?) onde foi morto; outro tio irmão de meu pai, deixou de ter vida no recente combate de Quicabo. O Domingues envia muitos cumprimentos a todos."

Nota do Bloger -Esta carta merece ser analisada com espírito crítico:
  1. Os sublinhados são meus.
  2. O autor da carta pede segredo sobre o assunto principal, tentando ocultar aos outros combatentes o desaire sofrido e mente ao Pastor, exagerando nas baixas sofridas pela tropa portuguesa.
  3. De 6 mortos ele passou para 60. Se usou o mesmo método para avaliar as suas mortes, quando diz que foram mais de 150, então teremos que sofreu mais 1500 mortos, o que em verdade nos parece exagero, embora tenham sido muitos.
  4. Mas depois quando argumenta dizendo que muitos dos mortos negros que ficaram no terreno eram do lado dos portugueses, aumentando assim as baixas do lado dos portugueses, está novamente a mentir, pois apenas dois negros acompanhavam a tropa portuguesa e nenhum deles morreu nem ficou ferido.
  5. Refere finalmente e perda de armas, (canhangulos e finas), e pólvora.
  6. Finalmente a referência às viaturas que ainda estariam no local, tambem é falsa porque todas as viaturas foram recuperadas no próprio dia 15 e a meio da tarde do mesmo dia toda a CC 115 estava acampada na base do morro Kuanda Maúa.



segunda-feira, 14 de julho de 2008

CC 115 - Operação Viriato Dia "D"

Chegou finalmente o Dia "D" para a CC 115.
Como se pode deduzir das fotos abaixo o moral era bom. Um certo espírito de aventura animava os militares que rumavam para o desconhecido, apesar de agora bastante mais previsível.
As fotografias que se seguem foram tiradas nas Mabubas, pela meia tarde do dia 14 de Junho de 1961, momentos antes da ordem de partida, numa primeira etapa até à Ponte do Lifune, em Anapasso.

Os cinco Oficiais Operacionais da CC 115 e o Médico.
Da esquerda para a direita temos: Alf. Noca (Nobre de Campos), Alf. Lima Barreto, Ten.Cipriano Pinto, Cap. Tomé Falcão, Dr Simões e Alf. Leite de Freitas.

1ª Sec do 3º Pelotão sobre viatura "blindada" a chapa de bidons de 200 litros.
Reconhecem-se: Sarg Guedes, Sold Adelino Alberto, Cabo Patrício, Sold Régua, e o Condutor Sold Vítor Chora, entre outros.


Outro aspecto da coluna e militares descontraídos, aguardando a ordem de marcha nas Mabubas.
Reconhecem-se em 1º plano ao centro: Cabo Bolrão, Alferes Noca, Sold. 1000, Nunes Inácio, Sold Américo Pegado Alves, e à direita o Sold Gasolina joga a derradeira sueca ou lerpa, sei lá, sob a vigilância do Cabo 120.


Outro aspecto da coluna militar, pronta para a partida.

Com este aparato e decisão saimos de Mabubas pelas dezasseis horas e, sem sobressaltos, chegámos a Anapasso já noite cerrada, passando, de imediato para a margem direita do Rio Lifune, onde pernoitámos com vigilância apertada por motivos óbvios. No dia anterior a CC 117 havia avançado até Kuanda Maúa e acampara no sopé do morro, junto à picada que leva a Quicabo, e sob o observação da CC 116, instalada na crista militar do mesmo morro de Kuanda Maúa.

sexta-feira, 11 de julho de 2008

CC 115 - O dia "D" da Operação Viriato

A Operação Viriato, cujo objectivo foi abrir os itinerários conducentes a Nambuangongo, ocupar esta vila e garantir o livre trânsito nos referidos itinerários, foi certamente a operação mais complexa de toda a campanha militar em Angola. Nela foram empenhadas forças muito significativas de infantaria, cavalaria, artilharia e força aérea, e mais tarde pàra quedistas.
A operação desenvolveu-se em vários tempos, durante cerca de dez meses, e contemplou várias sub-operações localizadas em sub-regiões do grande teatro de operações que eram os DEMBOS, (Sector 3 da Zona de Intervenção Norte).
Se bem que na sua concepção e execução se tenha verificado uma certa unidade e uniformização das acções conducentes à conquista dos objectivos almejados, as unidades autónomas tiveram diferentes dias "D" e diferentes objectivos intermédios, condicionados pela natureza dos obstáculos que lhes iam surgindo e ainda e sobretudo da disponibilidade de material de guerra, nomeadamente material circulante, (viaturas).
Assim, enquanto a CC 158 a partir do Ambriz e o BC 96 a partir de Úcua, tiveram o seu dia "D" (início da operação), aí por 10 de Julho de 1961, o BC 114 só ficou realmente operacional em 11 de Julho do mesmo ano e só em 14 seguinte se tornou possível ultrapassar, com viaturas, o Rio Lifune a norte de Mabubas, cuja ponte fora totalmente destruída pelo In e agora reconstruída, em madeira, pela Companhia de Sapadores em reforço ao BC 114.
Constituição da Testa de Ponte
Nestas circunstâncias, em 11 de Julho de 1961, faz hoje precisamente 47 anos, a CC 116 deslocou-se, de madrugada, de Mabubas para Anapasso, em viaturas com luzes apagadas, aproveitando o crepúsculo do plenilúneo, (lua cheia), para manter o segredo da operação. Chegados ali, os militares transpuseram o rio Lifune, a pé e sobre os destroços da ponte destruída. Um Pelotão (+) ficou a garantir a segurança e defesa do local e a outra parte da CC 116 constituiu Testa de Ponte, indo instalar-se no morro denominado Kuanda Maúa, a cerca de 4/5 quilómetros de Anapasso.
Ali, ocupou e organizou o terreno tomando posição defensiva na crista militar com postos de vigilância e observação em todas as direcções, nomeadamente sobre a picada que leva a Quicabo, apesar das grandes dificuldades criadas pela densa floresta que contorna todo o morro.
Por volta do meio dia de 11, chegou a Anapasso a Companhia de Sapadores 123 (-) que deu imediato início às obras de construção de uma ponte em madeira, apoiada nos tramos de alvenaria, caídos no leito do rio.
Em 14 passaram as primeiras viaturas de sul para norte pela ponte reconstruída em madeira.
Neste tempo, ou seja de 11 a 14 de Julho de 1961, a CC 115 fazia os últimos aprontos no Caxito, recebendo as últimas viaturas, que foram atribuídas aos respectivos condutores, sem qualquer treino para conhecimento das mesmas.
O Inimigo e o segredo militar
"O Segredo é a alma do negócio", diz o povo, e na guerra o factor surpresa é fundamental para o êxito das operações militares! Por mais cautelas que se tenham tomado nesse sentido, o segredo foi quebrado e o inimigo deu disso provas, nomeadamente num documento mais tarde encontrado e que, pelo seu valor histórico, vou transcrever:
Carta dirigida pelo Comandante da UPA de QUIPEDRO, (ANTÓNIO TIAGO CALEIA), ao Comandante da UPA de QUICABO, datada de 07JUL61
"Antes de mais nada espero que esta cartinha lhes encontre de boa saúde na companhia de vossas famílias. Nós cá graças a Deus estamos regulares e sempre temos pensado em vós.
Quero dizer-vos que neste mesmo dia às oito horas da noite apanhamos na Emissora Oficial isto é na Rádio onde os nossos inimigos faziam os seus discursos de contentamento e indicavam o lugar onde se encontram que é o rio Lifune, onde eles tentam avançar para o Norte inteiro.
Eles trabalham dia e noite arranjando a ponte do Lifune para poderem vir até aqui. Por isso quero dizer para vós não estarem cansados, mas sim devem fazer grandes buracos pelo caminho e cobri-los com coisas finas e por cima dos buracos com um pouco de barro para quando eles passarem cairen nesses buracos. Mas espero que usem de coragem para estes nossos inimigos não poderem vencer aquilo.
Tenhan coragem e tenham fé em Deus porque Este é o nosso Ajudador. Conforme diz a notícia da Radio, os nossos inimigos querem avançar para o Norte em direcção de Quicabo porque dizem eles que nesta região é onde se encontram os terroristas mais bravos.
Por isso irmãos espero que se mantenham bem firmes para o bom andamento do nosso trabalho.
Eles estão procurando os lugares mais fortes para depois de tomados fazerem daquilo que eles bem entenderem. Mas nós não o consentiremos. Meus irmãos tenhamos coragem e devemos estar bem unidos para vencermos este nosso inimigo facínoro.
Se Deus quiser quando receber o material hei de enviá-lo com urgência. Por aqui espero terminar com os meus cumprimentos."
Nota - Esta carta merece-me três comentários:
  1. É de salientar a correcção da escrita revelando uma erudição avançada, nessa matéria;
  2. A grande preocupação da UPA pelo avanço da tropa Portuguesa pelo eixo Lifune-Quicabo;
  3. A Emissora Oficial com a sua preocupação de levantar o moral das populações estava a dar cartas ao inimigo, nomeadamente revelando a reconstrução da ponte, que nessa data ainda estava em projecto.

quinta-feira, 10 de julho de 2008

CC 115 - A CC 115 e a UPA

Documentos referentes aos dias quentes de 15 de Março1961 e à organização da UPA (União dos Povos de Angola), apreendidos durante as operações, posteriormente efectuadas. Colaboração do Subintendente Manuel Valadas Horta.
Nota: Faça clik sobre as imagens para aumentar o zoom.







segunda-feira, 7 de julho de 2008

CC 115 - Caxito (Zona de Reunião)-I

O tempo urge e a preparação imediata para a intervenção operacional exige actividade permanente do pessoal. Nesse sentido, à patrulha do 3º Pelotão ontem a Anapasso, seguiu-se hoje uma saída de toda a Companhia para o mato, em deslocamento apeado, com permanência durante a noite naquele ambiente desconhecido e com regresso ao acantonamento no dia seguinte. Aí, os inimigos foram os mosquitos, além de todos os ruídos nocturnos que se ouvem na selva africana durante a noite, desde os produzidos por macacos desavindos, até aos dos necrófagos mais atrevidos. Nos deslocamentos nocturnos, ainda a ligação entre os elementos das patrulhas são mais difíceis de conseguir: se de dia era impossível manter as formações de combate, devido à densidade da vegetação, como já referi, de noite era mesmo impossível qualquer deslocamento por desconhecimento total do ambiente e não haver pontos de referência conhecidos nem cartas topográficas.
Por isso a noite foi passada num ponto estratégico que permitia uma boa defesa periférica e ali esperámos que amanhecesse.
No dia seguinte, pelas nove horas, estava a Companhia de regresso ao acantonamento, sem qualquer incidente.