sábado, 9 de agosto de 2008

CC 115 - Em Quicabo 03 a 13 de Agosto


De 3 a 13 de Agosto a CC 115 ficou sedeada em Quicabo como reserva do Comando do Batalhão.

Além das missões normais de patrulhamento e limpeza da região, garantia o reabastecimento das companhias da frente, 116 e 117, apoiando-as nos vários aspectos operacionais e logísticos, estes muito escassos, diga-se.

Dentro desta ideia geral de manobra o terceiro Pelotão fez uma série de patrulhas que mereceram destaque na minha tentativa de referir os episódios mais significativos dos dias que passei na ZIN-Sector 3:

Assim, a minha agenda refere que no dia 7 de Agosto a CC 116 progrediu de Balacende para Quissacala, sofrendo uma emboscada a meio do trajecto de que resultaram 3 mortos e 5 feridos. Em consequência o 3º Pel da CC 115, nesse mesmo dia à noite, foi de Quicabo até ao Comando do Sector na Tentativa, escoltando as viaturas que levavam os mortos e feridos da 116.

Chegado à Tentativa e entregues os feridos, o Comando determinou que os mortos deviam ir para Luanda e lá fomos até à capital, agora só com um jeep 3/4 Ton a acompanhar a viatura que transportava os mortos. Chegámos a Luanda por volta das 3 da madrugada e, cumprida a missão principal, resolvi dar uma volta pela cidade passando pela baixa, onde encontrámos uma cervejaria, ali muito famosa, (julgo que se chamava Versalles), que estava a fechar portas, mas ainda com bastante gente no seu interior.

Parámos as viaturas e saímos com o nosso ar de guerrilheiros maltrapilhos, barbudos e sujos da poeira das picadas.

Claro que fizemos a admiração daquela gente toda que ali se encontrava, civis e militares: fomos imediatamente cercados, todos querendo saber a que unidade pertencíamos, donde vínhamos e como estavam as coisas na frente.

Lá dissemos que éramos do 114 e da CC 115, o que deu origem a novas perguntas sobre o que acontecera no dia 15 de Julho em Kuanda Maúa e outras. Lá nos desenrascámos como pudemos e bebemos cerveja que pagámos, claro.

De regresso à Tentativa, estava à minha espera o Oficial de Operações do ComSec3, Tenente Coronel Montini, que me disse: "você é da 115, não é? então venha cá que lhe vou mostrar uma coisa que servirá de algum conforto!" E fomos ao seu gabinete, onde me mostrou um documento encontrado pelo Bat 96 em Muxaluando, que era, nem mais nem menos que um comunicado da UPA de Quicabo aos outros comandantes sobre o "COMBATE DE QUICABO", (leia-se: Kuanda Maúa), em que era reconhecida a maior derrota sofrida pela UPA, até àquela data.

Regressámos a Quicabo, já o sol aparecia por detrás dos montes de Birila.

Pormenor da cozinha em Quicabo

Alguns acontecimentos importantes relacionados com a guerra de Angola ocorridos no segundo trimestre de 1961

Visita do Min. do Ultramar e S.S.E. Aeronáutica a Angola.

Franco nogueira nomeado MNE.

Dean Rusk, durante a reunião da OTAN em Oslo, insiste junto do MNE português, em dois pontos: Necessidade de fazermos propaganda nos EUA para esclarecer e persuadir a opinião pública americana acerca da política portuguesa em África; a necessidade de realizarmos urgentes reformas nas nossas províncias africanas.

Reunião da Inter-African and Malgasy States Organizacion (IAMO), em Monrovia.

Discurso do Ministro do Ultramar, Prof. Adriano Moreira – Batalha da Esperança.

Entrevista entre De Gaule e Kennedy que considerava que Portugal estava agarrado a rígidas políticas coloniais.

De Gaulle concordou que a atitude portuguesa era inflexível e obsoleta; mas empurrar Salazar poderia causar uma revolução em Portugal e estabelecer um estado comunista na Península Ibérica.

Kennedy preconiza para os EUA uma posição progressiva em relação a Angola na ONU.Kennedy decide o embargo oficial da venda de armas para Portugal.

Início da concentração de poderes. O Almirante Sarmento Rodrigues toma posse do cargo de Governador e Comandante-Chefe de Moçambique, e é definido o esforço nos distritos de Cabo Delgado, Niassa e Tete.

Condenação de Portugal pelo Conselho da ONU (EUA em apoio).Fuga para o estrangeiro de muitos estudantes ultramarinos.

O General Venâncio Deslandes, nomeado em 06 de Junho, toma posse de cargo de Governador e Comandante-Chefe de Angola e é definida a missão de esmagar o terrorismo, tarefa que será mais facilitada com a concentração de poderes civil e militar.

Os ramos militares “Pogo” (Nó sós) do PAC e “Umkonto we szwe” (O fero da Lança da Nação) do ANC, desencadeiam a luta armada na África do Sul.

Criação, na dependência do Ministro da Defesa Nacional, do Secretariado de Estado da Aeronáutica.

Discurso do Presidente do Conselho reafirmando a decisão de resistir – O Ultramar Português e a ONU.

Ataque a S. João Batista de Ajudá.

Indicação segura por parte dos EUA, através do seu embaixador em Lisboa, de aspirações intervencionistas ou expansionistas de outras nações em relação a territórios portugueses.
Publicada por MVHorta em 23:52

Tópicos da minha agenda:

  1. Em 8 de Agosto recebi carta de minha mãe;
  2. En 10 de Agosto cortei o cabelo e a barba, o que não fazia desde 26 de Junho, data da saída de Luanda para o Caxito;
  3. Em 11, Patrulha à Tentativa, Comando do Sector 3, escoltando a viatura que transportou 3 feridos;
  4. Em 13, Patrulha a Balacende. No regresso matámos uma rola, que deu um bom churrasco.

2 comentários:

MVHorta disse...

Os ex-combatentes do BC 114 foram uns autênticos "mouros de trabalho", daqueles que vão a todas, que batem com eficácia do princípio ao fim toda a área à sua responsabilidade, que estão aqui, também vão ali e acolá, estão e vão a tudo quanto é sítio, por isso não é de estranhar que um pelotão operacional que se encontra na zona mais afectada pela guerra e em contacto quase diário com o IN, tenha que ser essa pequena fracção de combatentes, a deslocar-se a Luanda, a fim de escoltar as viaturas que transportavam os mortos e feridos, missão que, a meu ver, competiria a uma qualquer outra unidade de apoio da retaguarda.

NOCA disse...

Bem observado, Caro mvhorta! Aquela ida a Luanda foi qualquer coisa de fantasmagórico.
Embora o ambiente em Luanda fosse tenso e de grande expetativa, a nossa presença causou uma admiração e curiosidade entre os populares que nos viram, difícil de analisar: para eles eramos uma espécie de extraterrestres que tinhamos caído na cidade aquela hora tardia.
Éramos pau para toda a colher e tínhamos de acorrer a todos os fogos e sem equipamento nem armamento adequado às necessidades, além da escassez de géneros alimentícios que nos obrigou a passar dias de fome real.
"Esta é a ditosa Pátria minha amada!.....", lá diz o Poeta.